Testes farmacogenéticos reduzem em 4 vezes as faltas do trabalho por doenças da mente

Nos últimos dez anos, estudos conduzidos em várias partes do mundo têm demonstrado a eficácia do teste farmacogenético na personalização dos tratamentos para doenças mentais. Essa abordagem reduziu as faltas no trabalho em até quatro vezes, diminuiu as internações em mais de 50% e resultou em uma economia de quase U$1,2 mil por paciente no sistema de saúde. Além disso, pacientes com depressão que fizeram o teste farmacogenético apresentaram taxas de resposta e remissão significativamente maiores, especialmente a partir da 8ª semana de tratamento, em comparação com aqueles que não o fizeram. A remissão chega a até 100% na 24ª semana entre os pacientes orientados pela farmacogenética.

No Brasil, a tecnologia de farmacogenética está disponível há mais de uma década e tem ganhado destaque, com referências às influências genéticas sobre medicamentos de primeira linha em bulas aprovadas pela ANVISA.

A depressão é a principal causa de afastamento do trabalho no Brasil, afetando mais de 11 milhões de pessoas, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. No entanto, cerca de metade desses pacientes corre o risco de não receber a prescrição médica adequada logo na primeira tentativa, o que pode resultar em tratamentos ineficazes e taxas de recaída elevadas.

A farmacogenética, que combina farmacologia e genética para tratamentos personalizados, tem transformado essa realidade. No Brasil, o Dr. Guido Boabaid May e Paula Boabaid May introduziram essa abordagem há 12 anos, e hoje o país possui um laboratório de testes farmacogenéticos de ponta em Florianópolis, SC.

“A farmacogenética é uma espécie de GPS dos tratamentos medicamentosos não só da mente, mas oncológicos, cardiológicos, infecciosos, gastroenterológicos e outros, e é uma ferramenta fundamental na melhora real da qualidade de vida dos pacientes”, define o Dr. Guido sobre os testes que são feitos a partir da coleta de células bucais com um swab, uma espécie de cotonete que é esfregado na bochecha, de forma indolor, não invasiva e que pode ser realizada pelo próprio paciente no conforto de sua casa. “Hoje, o laboratório GnTech realiza 80% dos testes feitos no país e, por consequência desta abrangência, temos o maior banco de dados farmacogenéticos do Brasil, que são as informações genéticas e a sua correlação com a eficácia, segurança e tolerabilidade de 237 medicamentos para mais 13 mil indivíduos”, completa Dr. Guido sobre a importância da sua healthtech, empreendimento com o qual divide a agenda com o exercício da psiquiatria em Santa Catarina e São Paulo, onde faz parte do Corpo Clínico do hospital Albert Einstein.

Os testes farmacogenéticos são simples, envolvendo a coleta de células bucais por meio de um cotonete, e podem ser realizados pelo próprio paciente em casa. O laboratório GnTech, que realiza a maioria dos testes no Brasil, possui um vasto banco de dados genéticos, correlacionando informações genéticas com a eficácia, segurança e tolerabilidade de 237 medicamentos.

Eficácia comprovada 

O maior estudo já feito sobre a farmacogenética foi lançado em 2020 e pesquisou 487,409 indivíduos. Segundo McInnes et al., Clinical pharmacology & Therapeutics, 99,5% dos participantes carregavam pelo menos uma variante farmacogenética e, pelo menos 23,7% deles já teriam sido expostos a fármacos para os quais poderiam apresentar uma resposta atípica. “Já pensou, 22 anos tomando medicação? O meu organismo não assimilava totalmente as medicações. Ele (o médico) me passou uma dose maior, e com o tempo os remédios foram diminuindo. Eu não esperava que, em tão pouco tempo, ia dar essa reviravolta na minha vida e eu ia ficar tão bem”, comemora a empresária Valdesia A. Albino (um dos vídeos-depoimentos anexos), depois de ter sua prescrição médica revista de acordo com os resultados dos testes farmacogenéticos comprovando a melhora na qualidade de vida. Na prática,  segundo dados publicados por Winner e colaboradores na revista Translational Psychiatry em 2013, quem alinha tratamento com o seu DNA  diminui em até 4 vezes as faltas ao trabalho em virtude dos transtornos das doenças da mente. 

Outros dados asseguram que o paciente alcança não só a eficácia no tratamento, mas economia considerável. Estudos publicados por pesquisadores do Massachusetts General Hospital apontam que em pacientes com tratamentos falhos de transtorno de humor ou ansiedade, o teste farmacogenético reduz a utilização do sistema de saúde resultando em uma economia de U$1,229 em relação aos pacientes em tratamento não guiado. De acordo com os dados do estudo, considerando as particularidades genéticas do paciente, as internações teriam reduzido em 58%, as visitas à emergência em 40% e as visitas aos prestadores de saúde em 13% (Perlis et a., Depress Anxiety, 2018). No caso de pacientes psicóticos graves (e.g., esquizofrenia) e com baixa resposta terapêutica, a aplicação do teste reduziria ainda o número de hospitalizações anuais em 44%, a quantidade de dias hospitalizados em 14%, e a duração média de cada hospitalização por paciente em 55% (Carrascal-Laso, Pharmacogenomics and Personalized Medicine, 2021). 

Segundo o artigo de Winner, et al. Curr Med Res Opin (2015), a utilização do teste farmacogenético também teria sido associada a uma redução significativa nos custos gerais de medicamentos prescritos a 2168 pacientes com transtornos psiquiátricos durante um período de um ano. Em média, houve uma economia de U$1.036 por paciente no grupo que recebeu orientação baseada no teste farmacogenético em comparação com o grupo controle que não recebeu.

A evolução da farmacogenética 

Apesar de a farmacogenética ter ganhado destaque no Brasil apenas nos últimos anos, em diversos países, ela é considerada tão importante que mais de 33.000 artigos foram publicados sobre o assunto. Grandes órgãos internacionais, como a Food and Drug Administration (FDA), já incluem informações farmacogenéticas em mais de 400 bulas de medicamentos, influenciando a abordagem terapêutica. Além disso, em países da Europa e nos Estados Unidos, há legislação que cobre o teste farmacogenético por meio de planos de saúde, reconhecendo os benefícios do tratamento personalizado para todo o sistema de saúde. No Reino Unido, o piloto inicial de testes farmacogenéticos na atenção primária já começou e pode se tornar um programa nacional.

No Brasil, informações semelhantes estão começando a ser incluídas nas bulas aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para medicamentos de alta prescrição, como certos ansiolíticos (clobazam) e antidepressivos (citalopram). Além disso, tem havido um aumento nos casos de pacientes buscando autorização judicial para realizar o teste farmacogenético, e embora o volume ainda seja relativamente pequeno, os precedentes favoráveis estão se tornando cada vez mais comuns.

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